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Balada para um amigo

Essa aurora é a minha vez.
É a voz que me faltava e traduzia
um homem que nasceu.
Se penso em ti, logo me vejo sozinho,
e outro dia amei quem nem pensava.
Abri flores – agora estarão mortas.
Abri fendas – ainda estarão nas rochas.
Bebi meu último copo com o amigo.
Disse-me tantas verdades, o amigo,
que preferi partir sozinho à casa sóbria.
Lembro-me só, do pouco que falei,
que choramos juntos a música besta
e o assassinato de um chofer de táxi.
E pela manhã, quando as estudantes
desfilam seios e saias plissadas,
parei perto das estátuas, olhei pombos atônitos,
e não trazia uma frase
de improviso ou ensaiada
que dissolvesse a névoa, que revelasse ao amigo
por que naquele dia fui tão triste,
recitei tanta ventania,
e dei-lhe um abraço de monstro
e não lhe disse: – Acordei.
Meu amigo, se estiveres
lendo-me agora
ou escutando rádio,
se estiveres bem em tua cama e almofada,
me diga se o que houve
entre minha e tua palavra
foi vida, que tanto escorria,
ou foi a morte que nos encontrava.

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