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Resenha de Reynaldo Bairão

O Globo
Segundo Caderno
Domingo, 15 de março de 1987

LABIRINTOS DE SILÊNCIO NA NOVA POESIA
Reynaldo Bairão

Já inteiramente do seu métier, embora muito jovem (23 anos), dominando a palavra e dela tirando seu mais intrínseco sumo, o autor parece muito familiarizado com a leitura de bons poetas, colocando-se absolutamente dentro de nossa melhor tradição literária, ainda que evite um certo academicismo, tão típico, por exemplo, de certos componentes da Geração de 45. Felipe Fortuna, ao contrário, parece preocupado com a pesquisa formal, mas sem jamais cair num formalismo inócuo e precioso.
Criando uma poética intimista, muito ao gosto por exemplo de um Sérgio Milliet, ele se distancia do poeta e crítico paulista justamente pelo agenciamento da palavra, sempre empregada com muito critério, mesmo que venha eivada de lirismo “romântico” e pictórico. Aliás, uma das tipicidades deste excelente poeta é a plasticidade inerente a seus versos, mesmo os mais despojados, como no caso de “Klee”.
Lado a lado a esse aspecto formal, vamos encontrar o poeta preocupado com uma certa metafísica do silêncio, na concepção que lhe emprestou em pintura Giorgio De Chirico. Esse silêncio paira sobre o livro todo, ora complementado pela própria ideia de vulnerabilidade do ser, ora acrescentando nuances ao labirinto da solidão que persegue a cada instante. Esse precipício a que o poeta é arrastado, às vezes com resignação, às vezes com um sorriso sarcástico, leva-o, quase sempre, ao abandono, a um inexpugnável hiato que o faz afirmar, a certa altura:
Um dia reúno isso tudo
e publico um livro em branco.

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