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Sonetos de Louise Labé

IV

Depuis qu´Amour cruel empoisonna
Premierement de son feu ma poitrine,
Tousjours brulay de sa fureur divine,
Qui um seul jour mon coeur n´abandonna.

Quelque travail, dont assez me donna,
Quelque message et procheine ruïne:
Quelque penser de mort qui tout termine,
De rien mon coeur ardent ne s´estonna.

Tant plus qu´Amour nous vient fort assaillir,
Plus il nous fait nos forces recueillir,
Et tousjours frais en ses combats fait estre:

Mais ce n´est pas qu´en rien nous favorise,
Cil qui les Dieus et les hommes mesprise:
Mais pour plus fort contre le fors paroitre.

Desde que Amor cruel envenenou
O peito meu no fogo que fulmina,
Ardi-me sempre na fúria divina,
Meu coração jamais o abandonou.

Qualquer tormento, a que ele me obrigou,
Qualquer perigo e vindoura ruína,
Ou mau presságio que tudo termina,
Meu coração jamais se amedrontou.

Por mais que Amor nos ataque raivoso,
Mais nos obriga a vê-lo venturoso,
Sempre saudável ao vir combater:

Não é por isso que nos favorece,
Ele que os Deuses e os homens esquece,
Mas por mais forte aos fortes parecer.

VII

On voit mourir toute chose animee,
Lors que du corps l´ame sutile part:
Je suis le corps, toy la meilleure part:
Ou es tu donq, o ame bien aymee?

Ne me laissez pas si long temps pamee,
Pour me sauver apres viendrois trop tard.
Las, ne mets point ton corps em ce hazart:
Rens lui sa part et moitié estimee.

Mais fais, Ami, que ne soit dangereuse
Cette reencontre et revuë amoureuse,
L´acompagnant, non de severité,

Non de rigueur: mais de grace amiable,
Qui doucement me rende ta beauté,
Jadis cruelle, à present favorable.

Vê-se morrer toda coisa animada,
Quando do corpo a alma leve parte.
Eu sou o corpo, e tu a melhor parte.
Onde estás, pois, ó alma bem-amada?

Nunca me deixes tão sobressaltada,
Para salvar-me após seria tarde.
Ah, não coloques teu corpo em tal arte:
Junta-lhe a parte e metade estimada.

Mas vem, Amigo, e sê bem cuidadoso
Nesse reencontro e retorno amoroso,
Acompanhando-o, nunca de dureza,

Nem de rigor: mas de graça amigável,
Que docemente tem tua beleza,
Antes cruel, agora favorável.

XVIII

Baise m´encor, rebaise moy et baise;
Donne m´en un de tes plus savoureus,
Donne m´en un de tes plus amoureus:
Je t´en rendray quatre plus chaus que braise.

Las, te pleins tu? Ça que ce mal j´apaise,
En t´en donnant dix autres doucereus.
Ainsi meslans nos baisers tant heureus
Jouissons nous l´un de l´autre à notre aise.

Lors double vie à chacun en suivra.
Chacun en soy et son ami vivra.
Permets m´Amour penser quelque folie:

Tousjours suis mal, vivant discrettement,
Et ne me puis donner contentement,
Si hors de moy ne fay quelque saillie.

Beija-me ainda, rebeija-me e beija;
Dá-me um daqueles teus mais saborosos,
Dá-me um daqueles teus mais amorosos,
Quatro eu darei em que a brasa viceja.

Reclamas? Mas o teu mal se festeja
Com mais dez beijos meus deliciosos.
E ao misturar os beijos fervorosos
Os dois gozemos o que em nós chameja.

Cada um dupla vida assim terá.
Cada um noutro e em si mesmo estará.
Permite Amor que eu pense tal loucura:

Sempre estou mal, pois vivo em desalento,
E só consigo ter contentamento
Fora de mim, ao buscar aventura.

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